Fissura Vertical da Muralha.

Fissura Vertical da Muralha.

Fissura Vertical da Muralha

 

DEFINIÇÃO

Semelhante a uma rachadura na areia (sand crack), a fissura vertical é caracterizada pela separação do perióplio e camada córnea da banda coronária e estende-se por uma distancia variável na muralha da unha.

LITERATURA

A literatura veterinária é escassa sobre a etiologia da fissura vertical. Em um estudo realizado por Clarkson MJ, et al (1993), é a primeira dentre as condições causadoras de dor em vacas de leite, mesmo assim a incidência foi extremamente baixa. Em contraste, num outro estudo, Westra 1981, encontrou uma incidência extremamente alta em gado de corte e 2,7% dos animais que apresentaram fissuras verticais apresentaram claudicação (manqueira).

INCIDÊNCIA

A incidência de fissura vertical em vacas leiteiras é pequena, Clarkson MJ (1993) encontrou a lesão em somente 38 de 6901 animais avaliados. Podem ser encontradas ocorrências maiores, pois a incidência de manqueira nestas condições é baixa e as lesões podem passar desapercebidas, camufladas pelo esterco seco aderido às patas. Segundo Weaver AD (1986), historicamente no Canadá a incidência de fissuras verticais em gado de corte sempre foi alta com média de 37,2% e variações individuais de 20,5% e 63,3% nos rebanhos. O número de vacas afetadas em cada fazenda foi diferente numa mesma região e não parece estar relacionada à consistência do solo. Em um estudo, no Canadá, Goonewardene LA (1995) reportou uma prevalência de 22,7% de fissuras verticais em vacas de corte à pasto. De 1191 fissuras verticais estudadas, Weaver AD (1986) encontrou 85,6% nas unhas laterais dos membros anteriores. Este resultado confere com 80,6% encontrados em outra investigação realizada por Goonewardene LA (1995), onde 62% dos animais apresentaram uma fissura vertical, 29% duas, 5,4% três e 3,4% quatro ou cinco. Neste mesmo trabalho, as vacas de corte afetadas por fissuras verticais eram um ano e meio mais velhas e 43 quilos mais pesadas, quando comparadas com as vacas que não tinham as lesões. Este dado é sugestivo de que a suplementação de animais mais velhos resulta em um maior peso corporal e aumenta o risco da ocorrência de fissuras verticais. As fissuras verticais podem trazer prejuízos econômicos quando a incidência é alta, causam manqueira e descarte de animais produtivos precocemente.

ETIOLOGIA E PATOGENIA

A lesão começa com uma ou mais fissuras finas transversais estendendo-se distalmente do cório perióplico e banda coronária . A lesão ocorre a partir de uma considerável interrupção da estrutura do cório. A fissura pode se estender distalmente e tornar-se facilmente visível na face dorsal da muralha do casco. As grandes fissuras, usualmente possuem bordas esfarrapadas e podem apresentar espessamento da muralha em uma ou ambas as bordas. A resolução natural é rara.

A causa da fissura vertical é desconhecida. Tem havido especulações sobre a significante ou relativa importância de vários fatores contribuintes incluindo trauma, desidratação, laminite e deficiências minerais.

Historicamente acreditava-se que a doença era causada por fatores que desidratavam as unhas, causando redução da umidade e perda de espessura externa. O termo fissura na areia (sand crack) foi encontrado em livros de ferrageamento do século 18, associados com danos mecânicos causados às unhas.

A alta incidência na unha lateral sugere um componente anatômico na etiologia. A unha lateral tem um significante maior contato com o solo do que a unha medial. Segundo Scott GB (1988) os membros anteriores carregam mais da metade do peso corporal do animal. A inclinação dos dedos da frente (como pode ser hereditário, segundo Greenough PR, et al, 1991)  é mais íngreme do que dos dedos de trás. A lesão ocorre no ponto central da muralha dorsal da unha, diretamente acima do, não resistente, processo extensor da falange distal. Como este fator está presente em ambos animais, afetados e não afetados, não pode ser considerado um fator predisponente, porem pode explicar a localização da lesão.

A fissura vertical em vacas de corte, pode ocorrer associada a outras diferentes anomalias da superfície da parede da unha. Algumas podem ser remanescentes da laminite crônica, outras afetando as unhas distintamente como as linhas de estresse.

Estas observações combinadas com o consistente achado de que a condição possui maior prevalência em animais de corte confinados é indicativo de fatores relacionados a deficiência nutricional.

A função dos minerais na etiologia das enfermidades das unhas não é conhecida. A deficiência de cobre e zinco pode afetar a pele e os pêlos dos animais de um rebanhos. Eles são elementos essenciais para a produção da boa qualidade do tecido córneo das unhas. O aspecto é piorado por baixos níveis de selênio e altos níveis de molibdênio. O PH do solo, a presença de sulfatos na água de bebida e nas pastagens ou forragem leguminosa também afetam a equação. Evidências empíricas baseadas nas divulgações para comercialização de suplementos minerais sugerem haver algum benefício. Suplementos deveriam ser formulados estrategicamente para ajustar-se às circunstâncias individuais.

DIAGNÓSTICO

As fissuras verticais usualmente ocorrem na superfície dorsal da parede da unha, onde a articulação interfalangeana distal está protegida pelo processo extensor.  A lesão raramente ocorre acima da borda abaxial do processo extensor, onde a articulação dorsal está totalmente superficial. Se ocorrer uma infecção na fissura vertical, nesta região, há o risco de a infecção atingir a articulação interfalangeana distal do dedo.

A fissura vertical foi classificada em quatro tipos:

Tipo1 – Limitada à banda coronária.

Tipo 2 – Da banda coronária até o meio da unha.

Tipo 3 – Da banda coronária até a porção mais distal da parede da unha.

Tipo 4 – Do meio da unha até a porção mais distal da parede da unha.

Estes tipos provavelmente representam os estágios de evolução da fissura vertical. No tipo 4, a lesão está praticamente recuperada. Os tipos 1 a 3 representam a classificação quanto a gravidade. No tipo 1 não são observadas as bordas da fissura. No tipo 3, a lesão é caracterizada por uma abertura, com bordas esfarrapadas e pode haver exposição do corio.

As fissuras são facilmente observadas, com exceção do tipo 1 no qual as sujidades podem encobrir e dificultar a sua visualização e levar a falhas no diagnóstico. O examinar o dígito, é essencial a palpação da banda coronária. O tipo 1 está muito sujeito a infecção e resultar em abscessos  dolorosos abaixo do tecido córneo. Apenas algumas das grandes fissuras causam manqueira. Entretanto, o foco da manqueira sempre deve ser a fissura, quando estiver presente na pata dolorida.

TRATAMENTO

A maioria das fissuras verticais em gado de corte são benignas e não requerem tratamento. Somente algumas fissuras do tipo 1 são infectadas. Neste caso, deve ser realizado um pequeno desbaste na região inflamada para facilitar a drenagem. Usualmente, não é necessária anestesia para este procedimento, porque o tecido a ser removido já está isolado. Entretanto a ferida deve ser protegida com adstringente antibacteriano visando reduzir a produção de tecido de granulação. Um curativo de bandagem deve ser colocado ao redor da banda coronária.

Tratamento cosmético assim como methyl methacrylato para estabilizar o tecido, pode ser experimentado, mas esta intervenção apresenta resultado duvidoso na resolução da lesão. Caso a manqueira esteja presente em uma pata que apresente uma fissura, esta deve ser submetida ao debridamento e desbaste, para remoção de debris ou corpo estranho possivelmente presente neste local. Para minimizar o movimento de uma grande fissura durante o apoio da pata ao solo, a unha afetada deve ser submetida ao casqueamento, visando aliviar a pressão.

O possível benefício do efeito da biotina na qualidade do tecido córneo da unha tem atraído muita atenção. Embora o rúmen sintetize quantidades adequadas de biotina e vitaminas, sabe-se que a demanda aumenta durante períodos de estresse e o nível sangüíneo de biotina encontrado nos animais enfermos foi menor do que nos animais normais.

CONTROLE

O controle da fissura vertical é de maior preocupação somente em vacas parideiras, as quais possuem uma elevada incidência (mais de 35% dos animais adultos afetados). Embora medidas de sucesso no controle tem sido reportadas, somente algumas recomendações podem ser feitas:

  • Estimular a condição de escore corporal particularmente na primavera. O peso corporal acima da média pode predispor às fissuras. Alguns produtores podem ser obrigados a descartarem seus estoques antes da estação de parição, apesar da excelente condição.
  • Examinar as unhas de pelo menos metade dos animais maduros. Em casos de elevada ocorrência adotar medidas profiláticas de manejo.
  • Investigar a possibilidade de uma possível deficiência mineral

BIBLIOGRAFIA

  1. Clarkson MJ, Downham DY, Faull WB, et al: An epidemiological study to determine the risk fators of lameness in dairy cows. (University of Liverpool, Faculty  of Veterinary Science CSA 1379, 1993.
  2. Westra R.: Hoof problems in catlle – is there a relationship with trace mineral level? Proceedings of the 2nd Western Nutrition Conference. Edmonton, Alberta, Canada, 1981, PP 114-132.
  3. Goonewardene LA, Hand RK: A study of hoof cracks in grazing cows – association with age, weight and fatness. Can J Anim Sci 75:25 – 29, 1995.
  4. Weaver AD: Bovine Surgery and Lameness. Oxford, UK, Blackwell Scientific Publications, 1986, PP 199 – 200.
  5. Scott GB: Lameness and pregnancy in Friesian dairy cows. Br Vet J 144:273 – 281, 1988.
  6. Greenough PR, Vermunt JJ, Mc Kinnon JJ, et al: Laminitis – like changes in the claws of feedlot cattle. Can Vet J 31:202-208, 1991.

 

Por Dr. Luciano Marega

MV CRMV SP 7025

Tradução de texto do livro:  Lameness in Cattle

Autores: Paul R. Greenough e A. David Weaver, 1997

Third Edition, Página 109 – 111

 

Luciano Marega

Médico veterinário, Msc em cirurgia veterinária, palestrante Nacional e Internacional e Podologista Bovino.