Vacinas também podem tratar: entenda a diferença entre imunizantes profiláticos e terapêuticos.
Enquanto um previne doenças com a produção de anticorpos, o outro ajuda a tratar infecções já instaladas com resposta celular.
As vacinas profiláticas fazem parte da vida de pessoas de todas as idades. São aquelas injeções bem conhecidas que compõem o Programa Nacional de Imunizações (PNI) e ajudam a prevenir diversas doenças há décadas, como varíola, sarampo, influenza, entre outras. O que muitos não sabem é que existe outra classe de imunizantes cujo foco é tratar infecções já instaladas. Esses produtos são chamados de vacinas terapêuticas, pois atuam estimulando o próprio organismo a combater a doença.
Os imunizantes terapêuticos são formados por partículas que apresentam antígenos ao sistema imune para potencializar a resposta contra uma infecção. Essa estratégia tem sido estudada, principalmente, no tratamento de doenças virais, como HPV, HIV e hepatite B, e de alguns tipos de câncer.
Enquanto o foco principal das vacinas profiláticas é produzir uma grande quantidade de anticorpos, que ficam a postos para atacar vírus e bactérias invasoras, as vacinas terapêuticas são mais voltadas para a criação de uma resposta rápida de células T, em especial as CD8+, capazes de matar células infectadas.
Segundo a pesquisadora Luciana Leite, do Laboratório de Desenvolvimento de Vacinas do Instituto Butantan, a vacina profilática cria uma imunidade do zero. “Essa resposta demora um certo tempo para ser estabelecida e pode exigir mais de uma dose. O organismo desenvolve memória imunológica, que é ativada ao entrar em contato com o invasor, impedindo a progressão da doença”, explica. “Já a terapêutica aumenta uma resposta que já está acontecendo, durante uma infecção, mas não está sendo suficiente.”
Um mesmo imunizante também pode apresentar as duas funções. É o caso da vacina contra a raiva, fornecida pelo Butantan, que é indicada para prevenir a doença em pessoas com alto risco de se contaminar, como veterinários e pesquisadores que manipulam o vírus, e também para tratar quem acabou de sofrer uma mordida de animal.
“O vírus da raiva demora cerca de 45 dias para chegar ao cérebro e causar danos neurológicos. Por isso, se a vacina é administrada logo após o acidente, dá tempo de adquirir imunidade e combater o patógeno antes da infecção avançar”, diz a cientista.
Outro exemplo é a vacina da tuberculose (BCG), que também é utilizada para tratar o câncer de bexiga. A terapia ativa as células de defesa localizadas na mucosa da bexiga para que elas ataquem as células cancerígenas superficiais. Vale ressaltar que o imunizante não atua no tratamento da tuberculose, somente na prevenção.
Alguns estudos também sugerem que a vacina contra o HPV, que protege contra o câncer de colo de útero, pode ajudar a tratar verrugas genitais e lesões residuais após tratamento convencional. No entanto, o imunizante não é oficialmente indicado como terapia.
Butantan desenvolve novas vacinas terapêuticas contra tuberculose e HPV
Um novo imunizante contra tuberculose em estudo pelo grupo da pesquisadora Luciana Leite demonstrou efeito profilático e terapêutico em testes pré-clínicos. Além de fornecer proteção maior do que a atual vacina BCG, o imunizante reduziu significativamente a quantidade de bactérias e a inflamação no pulmão de modelos animais já infectados. A hipótese é que ele poderia ser usado como tratamento adjuvante, reduzindo o tempo da terapia tradicional e seus efeitos adversos.
Outra vacina sendo desenvolvida no Butantan pela pesquisadora Soraia Attie Calil, com a plataforma de RNA mensageiro, mostrou capacidade de prevenir e tratar a infecção pelo HPV. Em testes em modelos animais, o tratamento ajudou o sistema imune a eliminar as células infectadas. A vacina poderia atuar como um adjuvante para tratar a infecção e as lesões provocadas pelo vírus.
Reportagem: Aline Tavares
Fotos: Renato Rodrigues e Mateus Serrer/Comunicação Butantan.
Fonte: Portal do Butantan.